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Geopolítica e Política

Lusa - Lusística - Mundial

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À atenção dos passadistas

17.03.24 | Álvaro Aragão Athayde

‎Ampulheta com o o tempo a andar para trás

Ó Tempo! … Volta p'ra trás! …

 

Para os passadistas de plantão, o melhor já foi e a única possibilidade de hoje é viver para ontem.
Folha
 de S.Paulo, 12/02/2013 

 

 

Não, o Chega não vai desaparecer como o PRD. Eis porquê

Eu ria-me de cada vez que André Ventura dizia que um dia iria ser primeiro-ministro. Já parei de rir.

João Miguel Tavares • Público • 16 de Março de 2024, às 00:00

Tenho insistido muito neste ponto desde o dia 10 de Março, e vou desenvolvê-lo hoje aqui mais detalhadamente, porque algo de muito profundo aconteceu na política portuguesa em 2024, e há quem continue a não querer ver. Não basta dizer “18% por cento”, nem sequer “1,1 milhões de votos”, para perceber a força do Chega. É preciso olhar para a distribuição nacional dos votos, comparar o Chega com o PSD e com o PS, e começar a perceber que aquilo que até há pouco tempo era impensável pode mesmo vir a concretizar-se num futuro não muito longínquo. Eu ria-me de cada vez que André Ventura dizia que um dia iria ser primeiro-ministro. Já parei de rir.

A razão essencial para isso é que a distribuição de votos do Chega demonstra que o partido de André Ventura está a funcionar como uma tenaz. Boa parte da esquerda ainda está convencida de que os votos que ele está a captar são oriundos exclusivamente da direita ou da abstenção. Não é verdade. O Chega está a captar votos de conservadores, de saudosistas do antigo regime, de ribatejanos das touradas, de jovens fartos dos partidos tradicionais, de abstencionistas desiludidos – mas também dos eleitores do sul pobre, do interior abandonado e das grandes periferias urbanas. Ou seja, o Chega está a receber votos de todas as áreas ideológicas, de todas as classes e em todo o país. Sim, em 1985, o PRD também obteve perto de 18% dos votos. Mas o PRD nunca teve esta distribuição nacional.

Em 1985, o PRD não elegeu deputados em Bragança, Vila Real, Guarda, Portalegre, Beja, Madeira e nos círculos da Europa e de Fora da Europa. Para já, o Chega apenas não elegeu em Bragança – e mesmo aí obteve 18,2% dos votos, acima da média nacional. Vivendo nós num país que é ao mesmo tempo coeso e dual, dividido entre o Norte e o Sul e o Mediterrâneo e o Atlântico, o mais difícil para um partido político é instalar-se de forma homogénea em todo o território. O PRD nunca o conseguiu. Mais do que isso: o PSD nunca o conseguiu. E agora, o choque: o Chega está a consegui-lo.

Deixem-me repetir isto, porque é o ponto absolutamente fundamental destas eleições, e não me parece que esteja a ter a devida atenção: é a primeira vez que um partido de direita consegue aproximar-se da casa dos 20% com uma diferença tão curta entre o distrito onde foi mais votado e o distrito onde foi menos votado. O PRD em 1985 obteve 24,4% em Castelo Branco, mas 6,9% em Bragança. O Chega em 2024 obteve um máximo de 27,2% em Faro e um mínimo de 15,3% no Porto. Isso significa, no caso do Chega, que a diferença entre extremos fica abaixo dos 12 pontos percentuais. Estes são valores com os quais apenas o PS consegue competir em termos de homogeneidade do voto a nível nacional.

Fosse nos bons ou nos maus momentos, o PSD nunca realmente conseguiu quebrar a barreira Norte/Sul. O Chega está a consegui-lo. Não, 2024 não tem nada a ver com 1985 – e 1987 nunca irá voltar

Mesmo nos tempos gloriosos das maiorias absolutas de Cavaco Silva, o PSD ficava acima dos 60% no Norte, mas na casa dos 30% no Sul. Nas legislativas de 2022, em que o PS só perdeu na Madeira, o PSD obteve 40,3% em Bragança, mas 15,9% em Beja. Fosse nos bons ou nos maus momentos, o PSD nunca realmente conseguiu quebrar a barreira Norte/Sul. O Chega está a consegui-lo. O partido de Ventura teve três vezes mais votos do que o PCP no Seixal e em Setúbal, que são câmaras comunistas. Em Grândola, a mítica vila morena, outra câmara comunista que ainda resiste, o PCP teve 12,5% dos votos e o Chega 19,5%. Em todos esses concelhos ficou à frente do PSD. Não, 2024 não tem nada que ver com 1985 – e 1987 nunca irá voltar.

O autor é colunista do PÚBLICO

Original e comentários aqui.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

FIM

 

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