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Geopolítica e Política

Lusa - Lusística - Mundial

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Soberanistas versus Globalistas

13.05.25 | Duarte Pacheco Pereira

Zbigniew Brzezinski: Nation state as a fundamental unit of man’s organized life has ceased to be …

Zbigniew Brzezinski in Between Two Ages: America’s Role in the Technetronic Era, 1971.

 

 

Assim vai a democracia


A grande bipolarização na Euro-América é hoje a divisão entre nacionalistas e globalistas ou, simplificando, entre os defensores de um mundo de nações independentes e os de um mundo-humanidade.

Jaime Nogueira PintoObservador • 10 de Maio de 2025, às 00:18

As referências de Donald Trump ao Canadá como um possível 51º Estado dos Estados Unidos prejudicaram os nacionalistas e conservadores canadenses, ou seja, aqueles que, no Canadá, defendem o mesmo que ele defende nos e para os Estados Unidos e que estavam largamente à frente nas sondagens quando Trudeau saiu. Um nacionalista americano tem de respeitar um nacionalista canadiano, se não acaba por ceder terreno aos globalistas em nome do nacionalismo.

Outra eleição perdida pelos conservadores foi na Austrália. Embora o presidente americano tenha negado qualquer afinidade com Peter Dutton (o candidato conservador australiano, derrotado na eleição do passado fim-de- semana) e se tenha declarado amigo do vencedor (o trabalhista Anthony Albanese), o facto é que Dutton se reclamou pró-trumpiano – o que, com a polémica à volta das tarifas, se pode ter transformado num activo tóxico.

Também foi de mau gosto a imagem de Trump vestido de papa, numa inqualificável, gratuita e ofensiva mistura de Inteligência Artificial e Estupidez Natural. Entretanto, o presidente americano já reagiu, e com contenção entusiasmada, à eleição do seu compatriota Robert Francis Prevost como Papa Leão XIV. A escolha do nome é auspiciosa – Leão XIII foi o grande papa social do final do século XIX que, com a encíclica Rerum Novarum traçou uma “terceira via” entre o socialismo marxista e o capitalismo liberal, na linha de vários pensadores e movimentos católicos de leigos, como os Cercles Catholiques d’Ouvriers. A Rerum Novarum de 1891 marcou a doutrina social da Igreja, de que o mundo de hoje bem precisa.

As tarifas 

Trump parece dar razão aos seus críticos na aplicação das famosas tarifas. O uso de tarifas, de barreiras e taxas alfandegárias, como instrumento de política económico-financeira para alcançar determinados objectivos, como a redução do déficit externo ou a reindustrialização de certas actividades, é justificável e defensável, mas a sua determinação e aplicação não pode ser genérica, indiscriminada, como se houvesse uma conta de deve e haver entre a América e o resto do mundo ou como se “o resto do mundo” fosse todo um bloco.

O homem por detrás deste modelo tarifário e o principal conselheiro do Presidente na matéria é Peter Navarro, a quem Elon Musk se apressou a chamar “moron” (imbecil). É certo que Navarro tratara o dono da Tesla por “car assembler”, mas isso não explicará tudo. Scott Bessent, Secretário de Estado do Tesouro e financeiro de grande experiência e prestígio, apareceu depois do anúncio da suspensão por 90 dias das tarifas a justificar Trump. Bessent foi à Florida e voltou com Trump a Washington antes do anúncio da suspensão, actuando como uma espécie de mediador entre as posições radicais de Musk e Navarro. No seu encontro com os jornalistas, procurou dar como razão do vaivém tarifário a táctica negocial do Presidente, mas não restam dúvidas de que a reacção dos mercados foi decisiva para o recuo estratégico. De qualquer forma, como agora se viu com o acordo comercial com o Reino Unido, o método Trump parece funcionar.

Os amigos 

Um outro ponto interessante é a selecção dos contactos europeus do presidente americano, não em função da importância do país, mas da sua maior ou menor proximidade ideológica. O POLITICO apresentou recentemente a lista dos “amigos” europeus de Trump.

À cabeça vem, sem surpresa, Giorgia Meloni. Meloni teve vários encontros privados com Trump em Paris, na reabertura de Notre-Dame, em Mar-a-Lago, na Florida, na Inauguração e, mais recentemente, no auge da guerra comercial, e tem sido uma boa mediadora euro-atlântica entre o trio americano Trump-Vance-Musk e a “Senhora Dona Europa”, Ursula von der Leyen.

Viktor Orbán vem a seguir. Apesar das posições independentes de Orbán em relação à Rússia e dos investimentos chineses na Hungria, as afinidades ideológicas têm mantido a ligação e a troca de elogios.

Os polacos – como o candidato presidencial nacional-conservador Karol Nawrocky, que Trump, que nunca recebeu o primeiro-ministro Tusk, recebeu agora na Casa Branca – estão também na lista. Como está, e há muito, o nacionalista inglês Nigel Farage, líder do Reform Party. De França, curiosamente, não é Marine Le Pen a eleita, mas Eric Zémour, convidado em 20 de Janeiro para a posse.

A bipolarização

A grande bipolarização na Euro-América é hoje, claramente, a divisão entre nacionalistas e globalistas ou, generalizando e simplificando, entre os defensores de um mundo de nações independentes, guiando-se pelos seus interesses nacionais, e os defensores de um mundo-humanidade, um imenso mercado governado por uma oligarquia tipo Davos. Foi em nome desse imenso mercado que se levou por diante, sobretudo nas três décadas pós-Guerra Fria, as políticas que conduziram à desindustrialização e à aceleração da queda demográfica na Europa. E se tais políticas podem ter beneficiado – e beneficiaram – parte das populações das periferias, sobretudo as asiáticas, fizeram-no à custa das classes trabalhadoras e das classes médias do Ocidente.

Contra os globalistas têm surgido nos últimos anos grandes movimentos populares na Europa e nos Estados Unidos, movimentos que, apesar de combatidos e difamados pelo “sistema” e pelas suas poderosas máquinas de propaganda, têm registado sucessos. O último e mais retumbante destes sucessos foi a vitória de Trump; a seguir vieram as subidas da AFD alemã nas eleições de Fevereiro e agora a ascensão do Reform Party no Reino Unido e a vitória de Simion na primeira volta da eleição romena.

O “sistema” (gostava de usar um termo menos conspiratório, mas é difícil encontrar outro) tem recorrido a vários instrumentos para parar esta ofensiva. O primeiro é a propaganda, mesmo aquela que aparece como respeitável “opinião de referência”; e quando a Comunicação Social, o quarto poder, não funciona, recorre-se à Justiça, o terceiro poder, e mesmo aos poderes do “Estado Profundo”, na desesperada corrida para salvar “a democracia” dos ímpetos antidemocráticos do povo.

Assim, em Novembro, o Tribunal Constitucional romeno anulou a eleição de Calin Georgescu, argumentando uma misteriosa interferência russa a favor do candidato ultra-direitista. Os russos teriam alegadamente manipulado os eleitores romenos no momento do voto, através de um algoritmo saído do arsenal do novo KGB, o SVR, sucessor do mesmo KGB que nos 80 do século passado teria recrutado Donald Trump para “a causa russa”.

A vítima seguinte do terceiro poder foi Marine Le Pen, provável vencedora das eleições presidenciais francesas de 2027, condenada por “desvio de fundos europeus”. Fez o que fizeram e fazem outros partidos, em Bruxelas e na Europa, pondo os funcionários do Rassemblement National, pagos pelo Parlamento Europeu, a trabalharem para o partido.

Vamos ver se desta vez deixam acontecer a segunda volta da eleição presidencial da Roménia, a 18 de Maio, dia da primeira volta da eleição presidencial polaca.

Surpresa no Bundestag 

Para fechar, a eleição do governo alemão. Friedrich Merz, o novo líder da CDU-CSU, partido vencedor das eleições de Fevereiro, negociou com o partido do centro-esquerda, o SPD, uma coligação; mas ao apresentar-se ao Bundestag, na Terça-feira, 6 de Maio ficou a seis votos de ser aprovado como novo Chanceler.

A votação do Chanceler é por voto secreto e, ao que parece, alguns deputados da CDU-CSU ou do SPD não votaram em Merz. Perante o alarme e o prenúncio de nova eleição, marcou-se uma segunda votação; só então, se não houvesse então maioria, poderia haver nova eleição. Perante a necessidade de negociar com os sociais-democratas, Merz, um homem da grande finança que foi administrador do Black Rock e é tido como da ala direita da CDU-CSU, cedeu ao SPD em matérias-chave de imigração, clima e elasticidade da despesa, o que desagradou a muitos dos seus eleitores e, pelos vistos, também a alguns deputados do seu partido. As sondagens dão agora à AFD (o partido da direita radical que em Fevereiro, com 21% dos votos, elegeu 152 deputados) 26% do voto popular, o que a tornaria o primeiro partido na Alemanha.

Perante o risco para a coligação (e, logo, “para a democracia”) de a AFD (que, entretanto, parte da classe política, dos media e do Deep State quer proibir) ficar em primeiro lugar numa nova eleição, procedeu-se à segunda votação de recurso em Berlim; e Merz lá acabou por passar e com mais nove do que os necessários para a maioria.

O site POLITICO, insuspeito de simpatias de direita radical ou populista, concluía depois da segunda votação de 6 de Maio que o facto de Merz “começar assim o seu cargo de Chanceler” era “um indesmentível sinal da fraqueza”.

O inédito ultrapassar de todos os obstáculos para conseguir a pouco ortodoxa segunda tentativa de eleição só foi possível por um acordo dos dois partidos da coligação – CDU-CSU e SPD – com os Verdes e com a Esquerda ex-comunista.

Assim vai a Democracia …

Texto original e comentários dos leitores aqui.

 

 

Guildhall, City of London, England, United Kingdom

"Guildhall, City of London, England, United Kingdom" in Wikipedia, the free encyclopedia.

 

 

 

 

 

 

 

 

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